Educação e meio ambiente. Dois tópicos tão atuais e necessários, que muita gente já nem aguenta ouvir falar neles. Mas não saiam daí porque o assunto é nobre e envolve tatus gigantes.
Em sua recente vinda ao Brasil, Robert Yordi falou com a Revista Filantropia sobre o trabalho do Fundo de Conservação do SeaWorld & Busch Gardens, organização sem fins lucrativos da qual é diretor executivo. Criado em 2003, o fundo tem como principal objetivo financiar instituições focadas na preservação da vida animal, e já doou mais de 17 milhões de dólares a cerca de 800 organizações no mundo inteiro.
São quatro os focos de atuação: resgate e reabilitação de animais, educação ambiental, proteção de habitats e pesquisas de espécies. O SeaWorld Parks & Entertainment fornece toda a parte administrativa e custeia a operação do fundo, permitindo que cada centavo da arrecadação seja repassado diretamente às iniciativas apoiadas.
“Nosso maior desafio é a educação ambiental. Fico espantado quando converso com as pessoas aqui e ouço que a maioria dos brasileiros não conhece o que tem, não sabe muito sobre a Amazônia, não visitou vários lugares. É importante que as pessoas conheçam o próprio país”, comentou Rob, como prefere ser chamado (“Senhor Yordi é meu pai”).
Com mais de 30 anos de experiência em zoologia, o americano ainda se impressiona com o Brasil. “Brasileiros são apaixonados pelo trabalho com o meio ambiente, a vida selvagem. Sabem que a montanha a ser escalada é enorme, mas não é intransponível. As pessoas que temos aqui são incríveis e estão pesquisando espécies sobre as quais sabemos tão pouco, resgatando animais no litoral, cuidando de resíduos, micropartículas de plástico”, comentou.
Além de conhecer melhor os projetos financiados pelo Fundo e novos parceiros potenciais, Rob esteve aqui para o lançamento do programa “Curtir & Preservar”, que visa arrecadar recursos diretamente relacionados à venda de produtos extras dos parques temáticos SeaWorld Parks & Entertainment no mercado nacional. Ele selecionou três organizações que agora poderão dar sequência a seus projetos: GREMAR (Guarujá, SP), IPRAM (Cariacica, ES) e AMPA (Manaus, AM).
No programa, para cada compra de produtos opcionais ao ingresso, como planos de refeição, corta-filas e tours, 2 dólares são doados e destinados integralmente a projetos brasileiros que apoiam a preservação de espécies na vida selvagem.
Rob ressaltou a importância de plataformas como essa para a disseminação da mensagem do grupo. “Eu gostaria de falar com todas as pessoas do mundo sobre preservação, mas sei que é fisicamente impossível”, admitiu. “É por isso que precisamos de porta-vozes dispostos a falar sobre nosso trabalho, como esses stakeholders, que vão apresentar aos seus clientes a oportunidade de contribuir diretamente para a preservação. É uma maneira de levar ao conhecimento das pessoas viajando aos Estados Unidos que elas estão apoiando projetos no seu próprio país. É uma mensagem incrível.”
A Revista Filantropia quis saber mais sobre o processo de seleção dos projetos e como as ONGs podem aumentar suas chances de ser escolhidas. Primeiro, é importante ficar de olho nos prazos: duas chamadas anuais, uma em março e outra em julho ou agosto.
Um grupo de 75 funcionários dos parques SeaWorld, Busch Gardens e Discovery Cove analisa as inscrições, e os melhores passam à avaliação de um núcleo duro formado pelo próprio Rob, o presidente e quatro outros que leem todas as inscrições – foram 335 na última leva.Trata-se de um esforço hercúleo, em que as notas são depois compiladas e analisadas de acordo com os valores requisitados e o orçamento de cada projeto.
Em média, são distribuídos 1,2 milhão de dólares por ano para iniciativas do mundo inteiro. Uma vez escolhidos os mais importantes, que terão mais impacto, comparado com o investimento pedido e seu orçamento total, as informações seguem ao conselho para aprovação.
Além de se encaixar nos quatro grupos de foco da organização, e especialmente nos subgrupos listados no site sob “Conservation Priorities” (Prioridades de Conservação), Rob tem mais uma dica. “Uma das principais mensagens aos interessados é: leiam a ficha de inscrição com cuidado. É difícil para pesquisadores, mas mais fácil para boa parte do pessoal de campo: deem respostas envolventes. Não respondam como se fosse uma prova acadêmica; sejam divertidos”, aconselha. “Se tenho de ler 335 inscrições, lembrarei daquelas divertidas, com uma ótima mensagem, que buscam envolver não só os animais, mas também a população local e outros que possam influenciar a proteção daquele animal, do meio ambiente ou com o tipo certo de educação.”
Criatividade e proatividade também são elementos-chave na hora de buscar financiamento e impressionar a banca. “A última pergunta na ficha de inscrição pede aos candidatos para falar sobre o projeto e como engajariam nossos parceiros. Eu diria que 70% não são criativos nela, dando uma resposta chapa branca e passiva. Queremos saber o que você faria, queremos a mensagem certa para conectar com nossas centenas de milhares de seguidores, atrair ainda mais atenção aos projetos, parques, levando a mais doações e, portanto, a mais dinheiro para os projetos. É bastante cíclico. E isso tem faltado.”
Essa ciclicidade explica a importância da comunicação para o sucesso do fundo e sua atuação. Basicamente, sem dinheiro não há projetos, e sem a mensagem certa desses projetos, não há dinheiro. Além de programas como o “Curtir & Preservar”, doações para o Fundo podem ser feitas pelo site (swbg-conservationfund.org), pela compra de produtos selecionados nas lojas dos parques ou adquirindo uma visita de bastidores no SeaWorld Orlando. Empresas também podem tornar-se parceiras. Daí o outro conceito-chave dessa operação: engajamento.
“Queremos ver o máximo de dados sobre o dinamismo do projeto; se é algo em que veremos progresso ou alguém estudando a mesma espécie pelos últimos 20 anos e estaremos apenas estendendo esse estudo”, explica o executivo. “Precisa ser realmente empolgante, algo que possamos passar aos times de marketing e relações públicas para comunicar aos nossos visitantes. São eles que nos ajudam a conseguir o dinheiro para esses projetos, então queremos engajá-los no processo.”
Mão na massa
São muitas as histórias de sucesso do Fundo de Conservação do SeaWorld & Busch Gardens, diversas no Brasil. Entre elas, estão o programa de pesquisa dos golfinhos do Baixo Rio Negro (Amazon River Dolphin Conservation Foundation), implantação de corredores ecológicos no Pontal do Paranapanema (Weforest), implantação de local para reabilitação de peixe-boi (Instituto Mamirauá), preservação dos tatus gigantes — olha eles aí! — da região central (Royal Zoological Society of Scotland) e projeto com os pinguins de Magalhães perdidos na costa norte do Brasil (Instituto Mamíferos Aquáticos). Além da preservação, todos têm pelo menos mais uma coisa em comum: a mão na massa.
Como conta Rob Yordi, “preferimos ajudar parceiros com projetos que estejam na linha de frente fazendo a diferença. Ajudar a pagar salários num projeto de 300 mil dólares não é o nosso negócio. Queremos ajudar quem está fazendo algo concreto, financiando grupos de resgate e reabilitação que estejam de fato protegendo certa quantidade de exemplares de cada espécie, por exemplo”.
Ele cita o Programa de Preservação dos Tatus Gigantes do Pantanal. “Não se sabia nada ou muito pouco sobre o tatu gigante antes desse projeto. Tatus são uma espécie em que focamos, então isso se liga diretamente ao nosso apoio ao trabalho de campo de aprendizado. Nosso objetivo é encontrar projetos assim, não aqueles removidos em vários níveis de alguém realmente executando.”
O Fundo também não financia projetos de indivíduos, como doutorados e mestrados, mas somente parcerias via ONGs, universidades e organizações governamentais.
A companhia, que mantém um dos maiores conjuntos de animais do mundo e tem liderado diversos avanços no cuidado de espécies em zoológicos, resgata e reabilita animais terrestres e marinhos que são encontrados doentes, feridos, órfãos ou abandonados, com o objetivo de devolvê-los à vida selvagem.
A equipe de resgate do SeaWorld já ajudou mais de 34 mil animais em risco nos últimos 50 anos. Nesse período, a empresa construiu um diversificado portfólio com 12 parques temáticos e milhares de visitantes anualmente. A expertise construída nessa trajetória permite ao Fundo oferecer muito mais do que dinheiro aos projetos agraciados. “Nada do que fazemos é proprietário, exclusivo. Queremos dividir tudo que aprendemos”, destaca Rob.
Dinheiro, afinal, não é tudo. “Também temos enormes departamentos de educação em todos os nossos parques e visamos colocá-los em contato com as ONGs menores, oferecendo orientações técnicas, veterinárias, médicas, sobre manejo dos animais e reabilitação de resgate até educação ambiental.
Todas essas peças são elementos intangíveis. Há uma outra peça que acho importantíssima, que é a possibilidade de visitar os projetos, estar no campo, falar com as pessoas, ver como estão indo, o trabalho que apoiamos. Isso nos permite customizar o que precisamos para seguir em frente e é, em si, um investimento nos projetos.”
Para ilustrar o caso específico do Brasil, o executivo usa dados que soam quase surreais — mas que foram checados por esta reportagem. Os números mais recentes apontam que recebemos 6,5 milhões de turistas estrangeiros anualmente, em terras tupiniquins. Em Orlando, na Flórida, onde ficam os principais parques do grupo SeaWorld, são 72 milhões de visitantes, entre domésticos e internacionais.
“O Brasil tem muito a oferecer. Encontrar maneiras de encorajar o turismo aqui seria interessante para que as pessoas entendessem a importância do país, de seus recursos naturais, e também levar a educação ambiental correta às escolas, encorajar os estudantes a conhecer os animais brasileiros, o meio ambiente, como pode ser importante para o orgulho nacional”, imagina Rob.
“Esta geração que está vindo aí é a que realmente impactará o que criarmos. Quanto mais entrarmos nas escolas falando sobre preservação, o mundo natural e o Brasil, mais o país melhorará.”
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