O coronavírus na captação de recursos

Por: João Paulo Vergueiro
22 Junho 2020 - 00h00

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Tenho uma dúvida: quando você estiver lendo este artigo, será que já teremos superado a crise gerada pelo coronavírus, ou ela ainda estará nos afetando de forma significativa?

Essa resposta eu não vou saber – mas espero que seja sim. Independentemente disso, tem uma coisa de que eu tenho certeza: a captação de recursos no Brasil nunca mais será a mesma.

Se, como eu, você prestou atenção em tudo o que aconteceu no país nesses últimos meses, percebeu várias novidades na forma como as pessoas doam para as organizações da sociedade civil.

A principal delas foram as lives musicais e artísticas. As maiores lives do país exibiram códigos QR (QR Codes) nos quais era só apontar a câmera do celular para ser direcionado a um aplicativo, intermediando a doação para organizações que tinham iniciativas de combate aos efeitos do coronavírus. Foram milhões de reais em doações, com milhões de pessoas doando por todos os cantos do país.

Outros tantos milhões foram captados pela internet, em campanhas de financiamento coletivo, nas mais de dez plataformas existentes atualmente. E eu, que acompanhei mais de duzentas dessas campanhas, vi os números das doações e doadores crescerem dia após dia, sem parar.

Seja por meio de uma live, com código QR, ou por uma campanha na internet, não é exagero algum imaginar que a maioria desses doadores e doadoras tenha contribuído pela primeira vez com uma ONG, o que também foi outro resultado fantástico.

Fora da internet, a doação também foi destaque.

O Monitor das Doações COVID-19, iniciativa que lideramos pela ABCR, como parte da nossa atuação no Movimento por uma Cultura de Doação, mostrou que bilhões de reais foram doados em todo o país para iniciativas de combate ao coronavírus, com a maioria expressiva desse dinheiro vindo das empresas.

Apesar de terem muita capacidade financeira, empresas não são doadoras tão tradicionais como indivíduos, que no Brasil e em todo o mundo, doam de forma mais recorrente e em volume total muito maior. Mas, em uma emergência, como dispõem de mais recursos imediatos, as empresas podem fazer a diferença. E foi isso que vimos aqui: uma quantidade inédita de recursos mobilizados em doações, com as empresas fazendo parceria com organizações da sociedade civil em todo o país.

Além disso, a solidariedade esteve na linha de frente da cobertura da imprensa. O jornal Valor Econômico deu como manchete principal o valor total doado no Brasil quando ainda não tinha alcançado nem dois bilhões e meio de reais. E a revista Época colocou a doação como destaque da semana, quando chegamos a 3 bilhões de reais, valor que, no final das contas, acabou sendo muito maior. E foram vários outros destaques na mídia no país.

Qual o impacto disso para a captação de recursos? Simplesmente transformador.

De uma hora para outra, passamos a ter milhões de pessoas mais próximas das organizações da sociedade civil, dispostas a doar e efetivamente fazendo isso. Com um trabalho bem feito e dedicado, as instituições podem construir um relacionamento de longo prazo com essas pessoas, tornando-as doadoras recorrentes e alavancando a sua própria receita.

Além disso, todos estão mais conectados agora. A doação via código QR não é mais desconhecida de ninguém (ela já existia antes, bem como as lives filantrópicas), a tecnologia se disseminou e as pessoas sabem como usá-la. Como um código QR nada mais é que um endereço de internet, em formato de imagem, ele pode levar a qualquer página, inclusive à página de doações da sua organização – o doador não precisa sequer ter um aplicativo em seu celular.

Outro fator importante é que estamos perdendo a vergonha de pedir doações. Sim, essa vergonha existe. Muitas instituições, e suas lideranças, têm certo pudor em se expor pedindo doações para a organização.

O sucesso das captações realizadas em todo o país nesses últimos meses mostra que quem está pedindo, de forma estruturada e séria, e tem uma boa base de apoio na divulgação, está recebendo doações. Está provado que não tem por que não investir em captação de recursos.

De fato, estamos todos vivendo em um novo mundo, que mexe com a nossa vida de forma indiscriminada.

Para mim, isso é uma oportunidade. É um momento de mudança que podemos aproveitar para alavancar nosso relacionamento com a comunidade e com os doadores, ampliando a sustentabilidade financeira da organização. Eu não deixaria um momento desse passar batido se fosse você.

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