Nunca, como nos últimos tempos, se falou tanto em desenvolvimento sustentável e responsabilidade social. Por essa razão, considerei oportuno abordar um assunto diretamente relacionado a essa temática tão atual e instigante que, a cada dia, tem despertado mais atenção e interesse por parte das organizações: a futura ISO 26000. Trata-se de uma norma de diretrizes com todos os predicados para se transformar em um dos principais guias para as organizações no tocante a práticas de gestão social e ambientalmente responsável.
Iso é um prefixo grego que significa igual e é, também, a sigla da International Organization for Standardization, uma organização não-governamental internacional de padronização, formada por representantes de mais de 150 países, que, atualmente, entre outras finalidades, tem como objetivo estabelecer o padrão mundial para a implementação de diretrizes direcionadas à responsabilidade socioambiental. Criada em 1946 e com sede em Genebra, Suíça, a ISO elabora e difunde normas internacionais em todos os domínios de atividades – exceto no campo eletro-eletrônico, que é de responsabilidade da International Eletrotechnical Commission (IEC) –, por meio da cooperação no âmbito intelectual, científico, tecnológico e de atividade econômica, com a intenção de facilitar o intercâmbio internacional de produtos e serviços.
Histórico
ISO 26000, prevista para ser publicada em 2008, será a terceira geração de normas ISO, uma vez que já vigoram os sistemas de gestão da qualidade (ISO 9000) e o de gestão ambiental (ISO 14000), adotadas por mais de 600 mil organizações em todo o mundo. Contudo, diferentemente destas, a ISO 26000 não será uma norma para certificação, ou seja, ela servirá apenas como um guia de diretrizes e não como base para obtenção de selos e certificados de responsabilidade socioambiental pelas empresas e outras organizações. Felizmente!
A decisão da ISO foi elaborar uma norma de diretrizes em responsabilidade social dirigida para todos os tipos de organização. Essa determinação tem gerado um debate constante sobre o tratamento que será dado às empresas, pois há um temor de que a formulação das diretrizes, por se dirigir a organizações em geral, perca o significado concreto para a conduta das corporações.
A norma trará orientações sobre o processo de incorporação da responsabilidade social e ambiental às atividades de uma organização, além de indicações sobre os principais instrumentos, sistemas e entidades que, atualmente, tratam do tema, visando orientar as organizações de todos os tipos e tamanhos sobre os cuidados e princípios que devem ser seguidos por quem, um dia, desejar se tornar socialmente responsável.
Nesse sentido, com a publicação da ISO 26000, espera-se que a tênue linha que separa o discurso corporativo socialmente responsável das verdadeiras políticas e práticas empresariais ganhe contornos mais acentuados, servindo as diretrizes como parâmetro para a sociedade medir a verdadeira atuação socioambiental das e mpresas, uma vez que um dos principais objetivos da norma será o de estabelecer um entendimento comum sobre o que de fato significa responsabilidade social, a fim de que as iniciativas duvidosas sobre o assunto possam ser claramente resolvidas.
Composição
A ISO 26000 abrangerá três tipos de princípios. No primeiro, denominado Gerais, se aplicam todas as circunstâncias, como por exemplo, respeito à lei, a convenções e a declarações reconhecidas internacionalmente. Os princípios que fazem parte do segundo critério, chamados Substantivos, são voltados a resultados e avanço de critérios internacionalmente reconhecidos nas diversas áreas da responsabilidade social. Por fim, os ditos Operacionais dizem respeito à natureza e qualidade do processo, englobando inclusividade, accountability, transparência, materialidade e responsabilidade, entre outros aspectos.
O processo tem envolvido representantes dos mais variados países, organizações da sociedade civil e grupos sociais. O Grupo de Trabalho de Responsabilidade Social da ISO, responsável pela coordenação mundial dos trabalhos, está sendo liderado, pela primeira vez, em conjunto por entidades normalizadoras de um país industrializado, o Instituto Sueco de Normalização (ou Swedish Standards Institute – SIS), e de um país “em desenvolvimento”, a Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), que foi a vencedora dentre cinco outras candidaturas apresentadas. Vale dizer que o Brasil tem dado contribuições importantes para a elaboração da futura diretriz internacional de responsabilidade social. Para muitos especialistas, inclusive, o Grupo de Trabalho liderado pelo Brasil e pela Suécia tornou-se o principal fórum global de discussões multissetoriais sobre responsabilidade corporativa.
Sem o glamour dos anos 90 e resvalando para a banalização, devido à enxurrada de certificações, principalmente na China, é certo que a ISO ainda goza de relativa credibilidade em todo o planeta. Um fator importante para que esse estado se mantenha é que, a cada dia, as normas se renovam e passam a englobar outros conceitos, a exemplo da responsabilidade social. Por isso, tudo leva a crer que a futura ISO 26000 dará novo impulso às políticas e práticas de responsabilidade social no Brasil e no mundo, estimulando processos de mudanças de comportamento em todos os níveis da sociedade e, em especial, demonstrando às empresas que é possível aliar desenvolvimento sustentável com a manutenção do lucro. Afinal, como bem define o ecologista Francisco Milanez, “ganhar dinheiro sem sustentabilidade não é negócio”.