A contabilidade e a Agenda 2030

Por: Sandra Pedroso
03 Novembro 2022 - 00h00

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Você já ouviu falar na Agenda 2030? Nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS)? O que isso tem a ver com a contabilidade? Tudo! Vamos explicar o nosso entendimento.

A contabilidade é considerada uma ciência porque utiliza métodos científicos e princípios lógicos para demonstrar à sociedade o patrimônio das empresas, por meio de diversos “relatórios”. Entretanto, não podemos desconsiderar as diversas formas de apresentação dessas informações, tais como balanço social (BS), relatório de sustentabilidade empresarial, balanço social corporativo, relatório social e relatório socioambiental. Estes são alguns dos nomes utilizados pelas empresas, especialistas e acadêmicos para designar o material informativo sobre a situação da empresa em relação às questões sociais e ambientais, ou seja, o conjunto de informações e indicadores dos investimentos nas ações realizadas pelas empresas para o cumprimento da sua função social perante os seus funcionários, o governo e as comunidades com que interagem, direta e indiretamente.

O balanço social é um instrumento de demonstração das atividades das empresas que tem por finalidade conferir maior transparência e visibilidade às informações que interessam não apenas aos sócios e acionistas das companhias (shareholders), mas também a um número maior de atores: empregados, fornecedores, investidores, parceiros, consumidores e comunidades (stakeholders).

No Brasil, apesar de algumas propostas anteriores, o debate em torno do BS alcançou maior projeção somente a partir da campanha lançada em 1997 pelo Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase), liderada à época pelo seu então presidente, o sociólogo Herbert de Souza (Betinho). Essa campanha visava, principalmente, sensibilizar e estimular a noção de corresponsabilidade das empresas na busca de soluções para os profundos desequilíbrios da estrutura social do País. A fim de propiciar maior visibilidade dessa participação para o conjunto da sociedade, o Ibase elaborou um modelo de BS (o chamado Modelo IBASE1), com a colaboração de outras instituições. No mesmo ano, o tema passou a ser objeto do Projeto de Lei nº 3.116, de autoria das deputadas federais Marta Suplicy, Maria da Conceição Tavares e Sandra Starling, que estabelecia a obrigatoriedade da publicação do BS para empresas privadas com mais de cem funcionários e para todas as empresas públicas, concessionárias e permissionárias de serviços públicos. O projeto tramitou no Congresso Nacional após arquivamento temporário por conta do fim das legislaturas passadas, tendo sido reapresentado pelo deputado Paulo Rocha.

Paralelamente, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) apresentou, em 1997, em audiência pública, proposta de inclusão do BS nas demonstrações contábeis já exigidas das empresas de capital aberto, não tendo havido consenso na época quanto ao encaminhamento da matéria. Atualmente, porém, temos os relatórios específicos nos quais essas informações são obrigatórias e fazem a diferença para o investimento e a busca de novos acionistas.

Essa discussão toda levou à criação, a partir de 1° de janeiro de 2006, da Resolução do Conselho Federal de Contabilidade (CFC) 1.003/2004, que aprovou a Norma Brasileira de Contabilidade/Norma Técnica (NBC T) 15 – Informações de Natureza Social e Ambiental, que trata especificamente do BS e das demonstrações, ressaltando a natureza social e ambiental da empresa. Diversas organizações incentivam e trabalham para a divulgação de informações socioambientais pelas empresas, como por exemplo o Instituto Ethos (ETHOS, 2003), o Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS, 2002) e a Federação Brasileira de Bancos (FEBRABAN).

Essas demonstrações vêm em consonância com a responsabilidade social. Um dos primeiros conceitos foi feito por Milton Friedman (apud ASHLEY, 2002), que afirma que é a empresa que responde às expectativas dos seus acionistas, ou seja, está atenta aos seus stakeholders. Letícia Veloso (2004) assevera que é a efetivação de ações sociais que, elaboradas ou implementadas diretamente por empresas ou, pelo menos, financiadas por elas, visa atenuar a pobreza, melhorar as condições de vida e promover a cidadania de grupos ou populações carentes. O professor Dow Votaw1 afirma que não há consenso sobre o que é responsabilidade social. Para alguns, ela representa a ideia de responsabilidade ou obrigação legal; para outros, significa um comportamento responsável no sentido ético; para outros, ainda, o significado é o de responsável por alguma coisa de modo pontual. Segundo ele, “muitos, simplesmente, equiparam-na a uma contribuição caridosa; outros a tomam pelo sentido de socialmente consciente”. Já Patrícia A. Ashley (2002) entende que se trata do compromisso contínuo, nos negócios, por um comportamento ético que contribua para o desenvolvimento econômico, social e ambiental, pressupondo a realização de decisões dos agentes econômicos (stakeholders) que sejam resultado da reflexão quanto aos seus impactos sobre a qualidade de vida atual e futura de todos os que forem afetados por elas.

O Conselho Empresarial Mundial para o Desenvolvimento Sustentável, em 1988, diz que:

Responsabilidade Social corporativa é o comprometimento permanente dos empresários de adotar um comprometimento ético e contribuir para o desenvolvimento econômico, simultaneamente, a qualidade de vida de seus empregados e de seus familiares, da comunidade local e da sociedade como um todo.

Por outro lado, a pesquisa inicial do AccountAbility e do Copenhagen Centre concluiu que:

Os benefícios do desenvolvimento sustentável — resultantes da crescente preocupação das empresas com os impactos social, ambiental e econômico que exercem a chamada triple bottom line — continuariam limitados, a menos que passassem a integrar a competitividade das nações. (ZADEK,2003)

Korten (1996) já dizia que a sustentabilidade das empresas deveria adotar práticas ecológicas amigáveis e em conformidade com a estrutura e a estratégia empresarial. Shrivastava (1995) e Weizsacker et al. (1998), apesar de discordarem de Korten em alguns pontos, afirmam que as corporações podem ter papel fundamental criando economias sustentáveis.

Em 2000, a Organização das Nações Unidas (ONU), levando em conta todas essas discussões, propõe a Agenda de Desenvolvimento do Milênio (2000–2015), para a qual a participação de governos, sociedade civil, iniciativa privada e instituições de pesquisa contribuíram por meio da plataforma My World. Em 2015, após esse processo e para a ampliação do escopo, 193 Estados Membros da ONU adotaram a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável, com 17 objetivos, 169 metas e 232 indicadores que envolvem o desenvolvimento econômico, a erradicação da pobreza, da miséria e da fome, a inclusão social, a sustentabilidade ambiental, o compliance, a paz e a segurança. Os objetivos são divididos da seguinte forma:

1. Erradicação da pobreza

2. Fome zero e agricultura sustentável

3. Saúde e bem-estar

4. Educação de qualidade

5. Igualdade de gênero

6. Água potável e saneamento

7. Energia limpa e acessível

8. Trabalho decente e crescimento econômico

9. Indústria, inovação e infraestrutura

10. Redução das desigualdades

11. Cidades e comunidades sustentáveis

12. Consumo e produção responsáveis

13. Ação contra a mudança global do clima

14. Vida na água

15. Vida terrestre

16. Paz, justiça, e instituições eficazes

17. Parcerias e meios de implementação

Todas essas metas são acompanhadas e avaliadas constantemente para que possamos atingir os objetivos propostos. Esses dados têm que estar disponíveis de forma clara, objetiva e confiável, gerando os indicadores necessários para o monitoramento do atendimento aos objetivos.

E quem pode ser melhor para a produção de dados confiáveis sobre as empresas que o profissional da contabilidade? Esse é o nosso papel enquanto responsáveis técnicos das empresas — que de maneira geral aderiram também a essa Agenda 2030, pois os financiamentos, contratos públicos e privados têm levado em conta esse quesito para a negociação. Algumas pessoas físicas já procuram saber se a empresa na qual vão trabalhar ou comprar atendem a esses requisitos. Podemos ver esse movimento nos fundos ambientais, sociais e de governança (ESG).

Por isso é importante nos imbuirmos dessa missão, contribuindo para que empresas e governos atendam à Agenda 2030. O nosso objetivo é garantir parcerias e meios de implementação, o nº 17 das ações necessárias.

Faça parte deste movimento! Um mundo melhor depende de cada um de nós!

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